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sexta-feira, 5 de fevereiro de 2021

Jackpot

No último texto, deixámos expresso o nosso desejo de dar tempo ao clube — jogadores, equipa técnica, e administração — para manter o novo caminho escolhido, com a chegada de Rúben Amorim, e oferecer as melhores condições possíveis para o Sporting chegar ao título no próximo mandato. Apenas quatro meses depois, o Sporting fecha metade do campeonato com a sua melhor primeira volta de sempre: 14 vitórias, 3 empates, 0 derrotas, 9 golos sofridos, e um primeiro lugar isolado, na tabela, com uma distância de 6 pontos para o segundo classificado e outra de 9 para o terceiro.

Não existe nenhum sportinguista, neste momento, que não esteja já a pensar mais alto. É esta a natureza do clube. A nossa satisfação, contudo, não se prende apenas com o actual primeiro lugar: prende-se com a maneira como lá chegámos. Depois de uma época a lembrar o pior de Godinho Lopes, Frederico Varandas colocou todas as fichas no novo treinador-sensação da liga e tornou-o num dos técnicos mais caros da história do futebol. Uma aposta de enorme risco — a maior de um mandato até aí errático e frustrante — e que ultrapassou, até agora, todas as previsões e expectivas. Rúben Amorim, com o seu perfil e as suas decisões, trouxe, à direcção, aquilo que ela tinha prometido antes das eleições: uma equipa que junta a qualidade da formação a contratações cirúrgicas (com correspondência a um modelo de jogo) e que personifica, dentro e fora de campo, o compromisso exigido pelos objectivos do Sporting. Depois de uma "pré-pré-época", o novo mercado de Verão traria alguns dos melhores jogadores do campeonato fora do trio dos clubes grandes e o mercado de Janeiro conseguiria preencher, também, as últimas peças do puzzle (sobretudo a mais flagrante: a do avançado), conseguindo-se estreitar nacionalidades, por fim, para potenciar uma melhor comunicação no grupo.

O carisma de Amorim é óbvio e a empatia que consegue com os jogadores é outra das razões para o seu sucesso. Antes disso, contudo, devolveu uma identidade ao nosso futebol, ensinou os jogadores a defender e a atacar em bloco (algo que já não acontecia desde... Jorge Jesus), e introduziu uma mobilidade, no trio da frente, que garante variabilidade e criatividade a uma estrutura bem definida. Independentemente do resultado final deste campeonato, o jackpot do Sporting é esse: onde o clube tremia, dentro e fora de campo, hoje parece sólido, confiante, e seguro, fruto da competência da sua equipa técnica e, também, de uma direcção que lhe deu espaço e tempo para trabalhar. Tão grande quanto o nosso desejo para o final desta maratona, em termos desportivos, é o desejo de que Amorim e a sua filosofia de trabalho deixem uma influência na profissionalização da estrutura do futebol do Sporting. Quando todos sabem o que querem e somos fiéis a uma identidade, dentro e fora de campo, os resultados acabam por aparecer. Para já, celebremos esta primeira vitória. O clube merece.

segunda-feira, 27 de julho de 2020

Desunir o Sporting


Frederico Varandas:

"Quem contesta o trabalho desta direcção ou não percebe nada de futebol ou é intelectualmente desonesto." Setembro de 2019

Sporting 2019/20:

Liga: 4.º lugar com 22 pontos de distância para o 1.º
Taça: Derrota por 2-0 (Alverca, Campeonato de Portugal - Série D)
Supertaça: Derrota por 5-0 (Benfica)
Liga Europa: Eliminado pelo İstanbul Başakşehir (3-1 em casa, 1-4 fora)

Porto: 2 jogos, 2 derrotas
Benfica: 3 jogos, 3 derrotas
Braga: 3 jogos, 2 derrotas
Rio Ave: 3 jogos, 2 derrotas
Famalicão: 2 jogos, 2 derrotas

As palavras do presidente do Sporting, proferidas no início desta longa época desportiva, revelaram um traço que deixou poucas saudades: uma reacção a críticas ao seu trabalho que prefere, em vez da auto-crítica humilde, insultar sócios e adeptos com o direito a exprimir a sua insatisfação quanto ao rumo do clube (tendo ou não razão para tal). Os sócios pagam quotas e gameboxes em condições económicas difíceis e merecem respostas à altura da instituição que o presidente dirige. Frederico Varandas não é a última Coca-Cola do deserto nem é, muito menos, a única pessoa no universo sportinguista com capacidades para gerir os destinos do Sporting de uma maneira que deixe os sócios satisfeitos. A sua posição traz responsabilidade e deveria trazer humildade perante um universo que junta mais de 100 mil sócios e 3 milhões de adeptos e simpatizantes.

A principal contestação ao seu trabalho tinha sido, precisamente, o facto de vencer eleições com um lema ("Unir o Sporting") que pretendia juntar um clube fracturado e de ter decidido ignorar essas intenções às primeiras críticas. Devido ao contexto em que anunciou a candidatura, já tínhamos aqui apontado que teria de escalar uma enorme montanha para conseguir responder à sua primeira missão. Depois da vitória eleitoral, a sua comunicação preferiu falar mais vezes do passado do que aquilo que implementou, estruturalmente, no presente do clube, justificando-se com o estado em que Bruno de Carvalho havia deixado o Sporting, na consequência dos incidentes de Alcochete, para explicar os seus insucessos. No entanto, se Frederico Varandas achava que comparar legados iria fazer unir o clube à volta da sua candidatura, cometeu aí o seu primeiro erro, pois se 71% dos sócios votaram na destituição do anterior presidente, nunca é demais relembrar que 90% da mesma massa associativa votou na mesma pessoa, um ano antes, para lhe entregar um novo mandato após uma extraordinária recuperação financeira, desportiva e patrimonial que enterrou um plano de falência já em curso.

O segundo erro, como também previmos no mesmo texto, seria acreditar que o Sporting precisava apenas de uma mudança de perfis, com a mesma estrutura, para se tornar num clube vitorioso no futebol. Um dos problemas da administração de Bruno de Carvalho foi, precisamente, depender demasiado de um "regime presidencialista": um modelo ultrapassado, no futebol moderno, que torna a gestão de um clube demasiado dependente dos temperamentos de uma pessoa. O Sporting, como qualquer clube com ambições, precisa de uma estrutura alargada e profissional com elementos capacitados para funções de gestão desportiva, algo que não se ganha pela obtenção de créditos por equivalência por se ter atravessado corredores de um clube que nunca teve, precisamente, a estrutura de que precisava. Ao mesmo tempo, Varandas deixou-se rodear de simpatizantes do seu trabalho que se vangloriam, em comunicações públicas, de terem tornado o Sporting num clube mais de acordo com a sua "elevação", algo que apenas reforçou a "luta de classes" e tensões num clube que, fundado com o dinheiro de um visconde e por iniciativa de atletas, se tornou num emblema de popularidade nacional e transversal a todas as classes. Decididamente, os complexos sociais destes adeptos "notáveis" ainda influenciam, e de que maneira, a vida do Sporting, algo que está na base de uma longa guerrilha interna que motiva adversários e que atira o Sporting para a irrelevância.

Em dois anos de mandato, Frederico Varandas trouxe 14 jogadores para a equipa principal: Idrissa Doumbia, Cristian Borja, Tiago Ilori, Luiz Phellype, Valentin Rosier, Rafael Camacho, Eduardo Henrique, Jesé, Bolasie, Luís Neto, Fernando, Luciano Vietto, Gonzalo Plata e Andraz Sporar. Destes, apenas dois (Plata e Sporar) entraram no onze inicial no último jogo do campeonato (Neto substituiu Coates após lesão no aquecimento). Está espalmada, aqui, todo o falhanço de uma gestão desportiva que recorreu ao promissor treinador do Sporting de Braga (o quarto na mesma época), a troco de 10 milhões de euros (!), para tentar ultrapassar esse clube e conseguir uma entrada directa na Liga Europa (não conseguiu). Rúben Amorim, por sua vez, tem feito os possíveis para preparar a próxima temporada. Não tendo qualidade individual para um modelo de jogo interessante mas também exigente, encontrou um contexto indesejado mas "perfeito" para apostar na nova geração a sair de Alcochete: jogadores com talento mas demasiado inexperientes para carregarem todas as nossas esperanças em conseguirmos, na próxima época, algo melhor do que um lugar que desonre o clube.

Saberão Frederico Varandas e Hugo Viana enriquecer o plantel com jogadores que façam a diferença? Braga, Rio Ave, e Famalicão, clubes que contribuíram para o recorde de derrotas do Sporting numa só época (17), já têm prospecções mais eficientes e projectos mais sólidos do que aquele que podemos oferecer (que o diga João Palhinha, jogador que se valorizou muito com os anos passados em Braga). Não bastam bons atletas: são necessários jogadores que o modelo do treinador consiga potenciar. Para já, a presidência de Varandas ainda nem mostrou ter capacidade para responder à primeira dessas exigências, fazendo com que a nossa maior esperança, depois do que mostrou na primeira época planeada por si, recaia em que eventuais candidatos às eleições de 2022 (e um em particular) estudem afincadamente os erros do seu mandato para apresentarem um projecto de profissionalização do clube que esteja à altura do Sporting que todos merecemos.

segunda-feira, 2 de dezembro de 2019

Futebol? Um desastre.

Frederico Varandas foi inteligente em ter sido o primeiro a apresentar a sua candidatura à presidência do Sporting. Mesmo que o momento não tenha sido o mais indicado (e numa altura em que não estavam marcadas eleições), acabou por se assumir como principal alternativa, num clube desgovernado, para um universo sportinguista desesperado por ver alguma estabilidade emocional e directiva à frente dos seus destinos. Fruto da boa imagem que manteve, junto dos adeptos, enquanto director clínico, Varandas apresentou-se, também, como alguém com o conhecimento necessário para dirigir os destinos do clube graças aos vários anos passados na estrutura. Alguém que, segundo a comunicação da sua campanha ("Unir o Sporting"), conhecia todos os defeitos da casa e sabia exactamente o que fazer para remendar um projecto que tinha entrado em auto-destruição.

Antes de ser eleito, apontámos os nossos receios em ver uma proposta de estrutura que se mantinha demasiado centrada nas disposições de uma única pessoa. Se Varandas delega decisões em vários departamentos, o futebol, apesar de assessorado por Hugo Viana, passa apenas por si. Mais ainda, após um contacto directo com candidatos em sessões de esclarecimento, notámos que Varandas apresentava uma enorme convicção quanto ao seu papel no clube mas um conhecimento pouco transversal e detalhado das diferentes complexidades da gestão desportiva (nomeadamente num clube com a dimensão do Sporting).

Hoje, passados quinze meses da sua eleição, esses receios confirmam-se. De um lado, vemos um presidente que demonstra tiques de arrogância, na comunicação, que lembram defeitos do seu antecessor, e uma estratégia que, em vez de unir um universo de sportinguistas dividido por uma destituição e um evento traumático (como ainda se nota, com grande evidência, nas últimas votações em Assembleia Geral), prefere ser o presidente da "maioria silenciosa" contra uma "minoria ruidosa", não lhe interessando, como havia prometido em campanha, unir os sportinguistas independentemente das suas votações (com todas as dificuldades que isso pode trazer -- no entanto, é esse o seu trabalho). A própria questão das claques (que repetiram actos violentos depois de um jogo no Pavilhão João Rocha) parece ainda longe de estar encerrada, não parecendo resolver-se, inabilmente, com seguranças à porta dos estádios a retirar cachecóis e despir roupa, em adeptos sportinguistas, com adereços e símbolos desses grupos.

Se o universo extra-futebol tem trazido troféus e reconhecimento internacional ao clube (na continuidade do trabalho da anterior direcção e com a construção do pavilhão), as decisões da sua responsabilidade quanto ao maior activo do clube (a gestão do plantel principal de futebol) tem sido desastrosa. Em pouco mais de um ano, o Sporting já conta com cinco treinadores diferentes, sendo que a principal escolha de Varandas (descontamos Peseiro e os transitórios Tiago Fernandes e Leonel Pontes) recaiu num treinador holandês que se revelou completamente desajustado às exigências de um futebol português bem mais evoluído, tacticamente, do que aquele que existe na Holanda. Se Marcel Keizer trouxe dois títulos saborosos, lembramos que estes foram ganhos à custa de um futebol pobre e sem identidade, que remetia a iniciativa do jogo para o adversário (independentemente do nome), e da intervenção quase exclusiva do seu melhor jogador. Jogando como equipa pequena, o Sporting, a curto prazo, conquistou dois troféus, perdendo, a médio prazo, toda e qualquer organização táctica (defender com muitos não é defender bem) e motivação para os jogadores acreditarem nas suas capacidades em jogar futebol e impor o seu jogo.

Se Keizer foi "o" treinador de Varandas, o actual plantel também é "dele": uma equipa que, depois de várias janelas de mercado, ganhou várias contratações sem valor para o clube, apenas conta com um avançado de raiz, viu dispensados os maiores talentos da sua formação (Matheus Pereira, Daniel Bragança), e onde se investiu, ao contrário do que fora anunciado em campanha, em empréstimos de jogadores caros, sem historial de compromisso, e sem rendimento. Hoje, o Sporting é uma equipa de remendos onde qualquer treinador (uns, como Silas, com melhores ideias do que outros) se vê atado às suas condicionantes, vendo, a partir do banco, como diferentes sectores não se juntam, não constroem, e não oferecem criatividade, tornando qualquer situação de desvantagem, fruto da ausência de opções, numa batalha psicológica dos jogadores contra os seus próprios defeitos.

O Sporting, hoje, é um clube, uma estrutura e um plantel dividido. Vitor Oliveira, treinador do Gil Vicente, disse, com frontalidade, depois da sua vitória por 3-1, que os incidentes de Alcochete vão fazer com que o Sporting demore alguns anos a ter plantéis com a qualidade dos seus maiores rivais. É verdade. O que os incidentes de Alcochete não podem justificar é a manutenção de um clima de enorme divisão dentro da instituição, sem perspectivas de mudança na comunicação e na sua gestão, e uma incapacidade que se pode tornar crónica, devido às suas decisões no presente, em conseguir vencer equipas que lutam apenas pela permanência na primeira liga. Com 13 pontos de atraso para a liderança a 1 de Dezembro, Frederico Varandas parece estar, afinal, em plena aprendizagem de um papel para o qual dizia estar pronto. Pior do que isso, já não lhe restam muitas cartas para convencer o universo sportinguista, em níveis perto de máximos de descrença, que vai conseguir fazer melhor do que isto. Janeiro será o momento para mostrá-las, caso contrário, já sabemos o que nos espera. 

segunda-feira, 5 de agosto de 2019

Thank u, next


Primeiro jogo oficial da época 2019/20 e o resultado mais avultado, no derby, desde os 7-1, em Alvalade, de 1986. Cinco golos sem resposta, para o Benfica, e o sétimo jogo consecutivo do Sporting sem ganhar desde o início da pré-época. Marcel Keizer começa com aquilo que não teve na temporada anterior -- um tempo de preparação com um grupo de trabalho escolhido por si -- e a equipa revela ainda menor capacidade em desenvolver um futebol com princípio, meio, e fim. Assustadora é a falta de capacidade, também, em resolver o grande problema que a equipa mostrava sob a sua alçada: uma dificuldade gritante no processo defensivo e uma enorme ausência de rotinas colectivas sem bola. Contra uma equipa de transições ofensivas letais, como é o Benfica de Lage, cada jogada do adversário é um potencial cheque-mate, vendo-se o Sporting a abrir espaços e crateras constantes, com avançados (Dost) e médios (Wendel) ora sem instruções ora sem cultura táctica defensiva, à frente de um conjunto de defesas que revelam enormes dificuldades de coordenação (perante o pânico, também, de ver meia-equipa adversária passear na sua grande área). O resultado, para quem acompanhou o futebol do Sporting na época anterior e nas últimas semanas (e já é a segunda goleada que Keizer sofre contra Lage), não é, por isso, completamente surpreendente. Por isso, Presidente, sim, estamos (muito) preocupados.

Keizer terá sido contratado, também, para seguir uma lógica de investimento mais próxima daquela que é (ou era) a matriz do clube: a formação de jovens talentos. Desde a sua chegada, o treinador holandês tem alimentado, também, preocupações compreensíveis por vermos as participações desses jogadores resumirem-se a escassos minutos nas fases finais de cada partida. Na presente pré-temporada, esses atletas, ao contrário de uma integração progressiva dentro de um onze consolidado, têm sido lançados em bloco para jogar, simultaneamente, os últimos dez minutos (se não menos) de cada jogo, dificultando a sua integração nas rotinas colectivas. Desde que abdicou da (melhor) identidade do seu jogo, com os primeiros desaires na época anterior, Keizer preferiu abdicar do elemento de risco no seu futebol para revelar uma faceta resultadista sem ter as melhores ferramentas, no entanto, para consegui-lo (apesar de ter oferecido, com isso, duas taças ao clube, vencidas nos penáltis, e depois de uma vitória, frente ao Benfica, que se revelou um excepcional momento de superação anímica liderado pelo talento individual de um enorme jogador). Com o decorrer da pré-época, o treinador holandês pareceu revelar que esse traço, afinal, não foi apenas circunstancial, mostrando ainda grandes dificuldades em responder a um futebol mais exigente, em termos tácticos e colectivos (sobretudo defensivos), do que aquele que conhecia no campeonato holandês.

Num clube onde cada derrota (sobretudo no presente) é um convite a gritos revolucionários, é da mais elementar necessidade que a actual administração reflicta sobre aquilo que se vê em campo e que não confunda a importância da estabilidade com uma teimosia contraproducente que, com o tempo, poderá revelar-se perigosa. O futebol não só é demasiadamente pobre, para as ambições do Sporting e as opções que existem no plantel (mesmo que inferiores às dos rivais), como a gestão dos seus jovens talentos, por parte do treinador (mesmo que a estrutura de formação e prospecção tenha sofrido mudanças importantes), revela-se difícil de entender (se Matheus Pereira, o melhor extremo do clube, parece ser "uma questão para a administração", como Keizer respondeu em conferência de imprensa, é difícil entender a ausência de minutos de talentos como Daniel Bragança e Gonzalo Plata ou o desaparecimento, ainda, de Miguel Luís, jogador cuja evolução positiva se viu subitamente interrompida). A identidade um clube vencedor é feita, também, com uma dose inteligente de risco: o factor decisivo que, no meio de uma estrutura organizada e de um colectivo eficiente, diferencia os campeões dos vice-campeões (e outros).

De que treinador precisa o Sporting? Um técnico com capacidades suficientes para colocar a equipa a jogar em todos os momentos do jogo (e não apenas um), que conheça o futebol português, que aposte nos jogadores vindos da formação com uma integração positiva (e não apenas utilitária) e que -- algo que um clube desunido agradeceria -- sinta a importância e uma proximidade com o símbolo que leva ao peito. Existe um treinador, justamente, que cumpre esses requisitos e que orienta um clube sem nome e sem símbolo para um estádio vazio na zona de Lisboa. Até à saída de Marcel Keizer, esperemos que nenhuma administração, a Norte ou a Sul do país, acabe por contratá-lo para solucionar os problemas do seu próprio projecto.

domingo, 9 de setembro de 2018

O presente e o futuro do Sporting


Há duas leituras claras dos resultados das eleições do Sporting. A primeira é que João Benedito, tendo tido mais votantes do que número de votos (logo, os sócios mais jovens), conseguiu convencer aqueles que são o futuro do clube. A segunda é que, ainda assim, e olhando para a totalidade dos resultados, a maioria do universo sportinguista preferiu entregar as mãos do clube a alguém que conhecia a actual estrutura e que apresentou, mais do que uma filosofia ou uma mudança de paradigma no funcionamento no Sporting, medidas objectivas que apontam a um trabalho de continuidade e de melhoramento das lacunas que foram identificadas na actual realidade. Frederico Varandas ganharia, muito provavelmente, uma segunda volta nestas eleições, e a sua eleição sai, por isso, não com uma sensação de divisão mas de união à volta do seu projecto. 

O melhor desta noite de eleições foi isso mesmo: as excelentes declarações tanto de João Benedito, mostrando o seu apoio total à lista escolhida pelos sócios, como as de Frederico Varandas, que pediu a João Benedito para se manter próximo da vida do clube. Esse é o primeiro grande sinal de força do Sporting para o presente e futuro: um presidente eleito que, pelo seu conhecimento interno da estrutura e da realidade de trabalho que viveu nos últimos anos, pode oferecer (pelo menos) uma transição eficaz entre a administração destituída e a seguinte (seja quando for), reforçando os alicerces de um clube que sofreu um dos maiores terramotos da sua história. O apelo de Varandas a Benedito tem a sensibilidade e inteligência de perceber exactamente isso: que o futuro de um Sporting forte só existirá com essa atitude e abertura no presente, e que ele será a ponte, também, para quem irá sucedê-lo com um projecto que, podendo ser diferente, encontrará, provavelmente, uma fundação mais sólida para funcionar melhor.


O primeiro sinal, depois desta noite, não podia ter sido melhor. O sucesso da actual direcção será o de todos os sportinguistas, tal como João Benedito entendeu e soube dizê-lo nas suas palavras. É um ambiente de salutar e que nos dá esperanças quanto ao presente e futuro de um clube que sempre se pautou pela divisão. O séc. XXI sportinguista, para já, se se mantiver o espírito de colocar o clube à frente dos interesses pessoais, tem tudo para funcionar. Assim esperemos. De nossa parte, estaremos sempre na bancada para apoiar. Viva o Sporting!

segunda-feira, 3 de setembro de 2018

Unir o Sporting (e torná-lo profissional)


Parece haver um sentimento bastante comum entre os sportinguistas, nestas eleições, de não olhar para nenhuma candidatura como o projecto que irá descansá-los de todas as suas preocupações. Num dos momentos de maior desunião da nossa história, acaba por não ser uma grande surpresa, por isso, ver um número tão elevado de candidatos. Por um lado, se os projectos e as estruturas são muito importantes, é preciso ter em conta, por outro, uma das maiores verdades da performance desportiva: não há vitórias sem união de grupo, e a ausência de um palmarés, no futebol profissional, à altura da dimensão do Sporting também se explica pela turbulência e as intrigas permanentes de um clube que poucas vezes pensou nele próprio e muitas mais nas figuras e nos interesses pessoais que viviam nele. Divisões e gestos que, na catástrofe que se viveu recentemente, conseguem facilmente apagar os melhores momentos de uma direcção que começou a trabalhar para a sobrevivência de um clube e que acabou a trabalhar para a sobrevivência do seu dirigente máximo, ficando para a história como a primeira a ser destituída em mais de cem anos de existência.

De todas as candidaturas, duas delas têm projectos que parecem apontar para uma profissionalização da estrutura do Sporting na realidade desportiva do séc. XXI: a de Frederico Varandas ("Unir o Sporting") e João Benedito ("Raça e Futuro"). Num mundo ideal, uma candidatura única que reunisse estes dois projectos, que partilham alguns pontos em comum, seria, seguramente, aquilo de que o clube precisaria para conseguir essa união tão necessária ao sucesso -- suficientemente agregadora, portanto, para chamar a maioria dos sócios e poder juntar, à sua volta, ainda outras candidaturas. Alguns pontos são praticamente idênticos, como a criação de uma unidade de "performance" e de apoio ao atleta e a identificação de lacunas na mentalidade competitiva e de adesão ao clube por parte dos atletas da formação,  tal como o entendimento que a estabilidade financeira do clube só vem com o sucesso desportivo. Existem, no entanto, diferenças fundamentais que impedem que elas se juntem numa só: o tipo de estrutura pensada para o clube e a preparação dos seus elementos para a gestão desportiva.

Frederico Varandas, por conhecer a realidade do clube por dentro, opta por manter uma estrutura muito semelhante àquela que tem existido no Sporting: um regime mais "presidencialista", com intervenção directa no futebol, identificando as lacunas da estrutura na performance, filosofia de formação e método de captação de jogadores, corrigindo-as de acordo com a experiência adquirida em sete anos de direcção clínica no Sporting. Fruto da sua demissão depois de terminada a época desportiva, e, sobretudo, ainda antes das rescisões no plantel, o anúncio da sua candidatura acaba por ficar associado a um momento de enorme ruptura no Sporting. Independentemente da sua vontade em mudar o clube (e vemo-lo como um acto genuíno, contra quaisquer outras teorias), anunciar a sua candidatura em associação directa à demissão do departamento clínico, e numa altura em que ainda não estavam marcadas eleições, não terá sido, reconheçamo-lo, a forma ou o momento mais indicado perante a situação que o clube vivia (talvez o momento possível, no seu ponto de vista, mas não o ideal perante um grupo de trabalho que se viria a desmoronar). A sua candidatura, fruto das subsequentes rescisões, veio a suscitar, por isso, maior desunião do que união dentro do universo sportinguista (e não necessariamente por quem votou contra a destituição da anterior direcção), deixando dúvidas quanto aos sentimentos que o clube poderá reviver (com uma vitória que será sempre minoritária para qualquer candidato) em caso de maiores dificuldades.

Paradoxalmente, é o projecto de Frederico Varandas que acaba por oferecer uma maior continuidade em relação ao funcionamento actual do clube e da sua estrutura, apesar de não vir a recolher os votos dos sócios indefectíveis do último presidente. Trata-se, por isso, de uma candidatura que procura "remendar" o que está mal, a partir do conhecimento vivido no departamento de futebol, com ideias positivas no sentido de aproximá-lo da maneira como os rivais do Sporting já trabalham há vários anos. Se isso chega para fazer dele um bom presidente do Sporting, e apesar de apresentar boas ideias, já é uma questão que, durante a campanha, não ficou totalmente esclarecida pelo próprio, ficando claro que a sua candidatura não soube pacificar as dúvidas quanto às suas capacidades de agregação (de poder responder, portanto, ao seu lema), do próprio corresponder à exigência multifacetada do cargo de presidente e, da mesma maneira, da experiência ou competência de alguns membros da sua lista, independentemente do seu sportinguismo, no trabalho específico da gestão desportiva (tendo mesmo uma demissão na sua lista para o Conselho Directivo, devido a ameaças de violência, acabado por confirmar algumas dessas dúvidas e levantar, inclusivamente, indesejáveis fantasmas ou indesejáveis associações dentro da estrutura de decisão), nunca tendo sido capaz de se libertar, por essa razão, de um discurso ensaiado (por aquilo que será uma agência de comunicação) em vez de partir do foco que seria naturalmente suscitado pelo seu projecto.

Apesar de se focar, também, na performance desportiva como factor determinante para o sucesso global do clube, colocando o que acontece dentro das quatro linhas como o centro de gravidade de toda a gestão, João Benedito traz, com a sua equipa, um projecto assente numa outra filosofia: uma estrutura diferente daquela que existiu no clube nos últimos anos (e que existe agora) e que assenta na experiência de competição e na cultura de vitória de ex-atletas do universo Sporting que ganharam, entretanto, experiência profissional nas áreas de intervenção às quais se propõem candidatar. Em vez de recebermos pessoas de fora para dentro do clube (como tem sido apanágio, e como Varandas repete-o pelo menos em parte no seu projecto), esta é uma candidatura que, pelo contrário, recupera as pessoas que "nasceram" dentro dele para devolverem aquilo que o clube lhes deu: uma cultura desportiva e de gestão que aponta exclusivamente para a conquista de títulos. Se todos os candidatos se apresentam publicamente com esta mentalidade, a candidatura de João Benedito é a única que consegue trazê-la para dentro do clube por tê-la efectivamente vivido na gestão desportiva. Curiosamente, é uma candidatura compreensivelmente descrita como portadora do "ADN do clube" (recordando o exemplo fundador de Francisco Stromp, numa realidade desportiva diferente) apesar deste tipo de gestores (que conhecem e viveram, de facto, a performance e gestão desportiva) nunca ter vingado nas décadas recentes da estrutura do Sporting (um afastamento em trabalho e filosofia que poderá explicar, nem que seja por mera sugestão, a dificuldade em encontrarmos capitães e referências fortes dentro dos grupos de trabalho do Sporting, nomeadamente no futebol).

Se a intenção de profissionalização da estrutura é também um ponto assente da sua candidatura, João Benedito monta uma estrutura mais alargada para o funcionamento do clube. Apesar da importância e intervenção da figura do presidente, terá um vice-presidente exclusivamente para a área do futebol (Carlos Pereira, ex-atleta e treinador da casa que conhece o futebol português e a formação do Sporting) -- um cargo ausente na estrutura de Varandas --, ficando André Cruz mais próximo do balneário e dos jogadores. Por outro lado, Benedito traz ainda a figura de um CEO (chief executive officer), algo envolto em algum mistério, devido à impossibilidade de divulgar o seu nome, e que traz sempre alguns fantasmas de má-gestão na nossa história (devido à importação de agentes do sector bancário para o clube que foram gerindo o Sporting nas últimas décadas...). No entanto, esta decisão responde à necessidade de profissionalização empresarial e do sector corporate do clube, uma área onde os números e a estratégia de gestão estão a milhas dos nossos rivais, respondendo, por isso, a uma necessidade imperativa das estruturas dos grandes clubes desportivos no séc. XXI (não ficando essa necessidade estratégica apenas a cargo de um CFO -- chief financial officer -- como era Carlos Vieira, na direcção anterior, ou como existe na estrutura de Frederico Varandas: um "homem das finanças", logo, com menor visão estratégica em termos de gestão empresarial e desportiva). 

Se a consciência de que o Sporting não é ainda um clube totalmente profissional na sua gestão desportiva e empresarial, a candidatura de João Benedito parece responder de forma mais alargada a esta ideia, preferindo um modelo menos "presidencialista" (ou menos assente na personalidade de um presidente) e, por isso, mais estruturado a uma ideia de longo prazo, não dependendo inteiramente de personalidades e feitios, apesar de uma mentalidade bem vincada, e mais adequada, portanto, à execução de uma estratégia de gestão. Ao mesmo tempo, parece oferecer uma ruptura naquilo que tem sido a história do Sporting, que se tem pautado pela importação, para as suas listas, de pessoas de inegável sportinguismo, vindas de outras áreas da sociedade, mas que trazem desconhecimento quanto à realidade concreta da gestão desportiva. No conceito de Benedito, foi a própria experiência desportiva, dentro das várias áreas de competição do Sporting, que acabou por dar a formação necessária para a gestão executiva de um clube, complementada por uma experiência académica e profissional dos membros da sua equipa dentro e fora do Sporting. É um diagnóstico, a nosso ver, perfeitamente justo quanto aos resultados das sucessivas gestões danosas que o Sporting tem sofrido, e o primeiro a respirar, de forma mais veemente, aquilo que o Sporting acaba por contribuir para o próprio país. A consciência de que a área desportiva precisa de ser profissionalizada é complementada, em paralelo, com o crescimento da sua área empresarial pela presença de um administrador (CEO) que executa uma estratégia de gestão de maneira transversal às áreas não-desportivas, sendo a única candidatura que parece ter essa visão, no seu programa, para cimentar a sua presença no futebol dos grandes clubes (os que jogam na Champions League) e permitir, inclusivamente, que futuras administrações possam dar continuidade ao trabalho de gestão da equipa que vierem a substituir, tal como em qualquer grande empresa. 

Por fim, importa evocar questões de comunicação que foram reproduzidas nas intervenções dos candidatos nas suas aparições públicas, em debates e entrevistas, e nas suas presenças em sessões de esclarecimento nos núcleos. Se a candidatura de João Benedito foi a primeira (ou mesmo a única) a respeitar, e comunicando-o publicamente de forma clara, os interesses de comunicação do Sporting (não comparecendo em debates em canais de televisão -- e sensacionalistas, diga-se, que de muito se alimentaram dos acontecimentos de Alcochete para fazer subir as suas audiências -- antes de comparecer nos debates da Sporting TV), o candidato não assentou a comunicação do seu programa em soundbytes ou frases feitas, expondo-a, por outro lado, a partir da implementação das suas ideias, da sua filosofia, e do método de trabalho concreto de uma equipa unida, parecendo-nos claro, também, que essa mesma comunicação irá espelhar o espírito de execução que pretendem trazer para dentro do clube (não podendo o mesmo dizer-se da candidatura de Frederico Varandas, que não reproduz o mesmo foco nem um pensamento tão desenvolvido e estruturado nas suas comunicações). 

Ao ter presenciado sessões de esclarecimento dos dois candidatos num mesmo núcleo do Sporting, a disponibilidade de comunicação quanto à realidade de todas as áreas do clube e os seus projectos para estas últimas, a profundidade do seu conhecimento e detalhe, o foco e estrutura do discurso e a experiência prática da sua equipa na gestão desportiva deram a entender, de maneira extraordinariamente clara, que, ao contrário do que julgava no início da campanha, não é o candidato Frederico Varandas ou a sua equipa que têm melhor conhecimento sobre a realidade de trabalho do Sporting (e os conceitos de gestão desportiva) nem as propostas mais realistas e concretas para o clube mas sim o candidato João Benedito, o seu plano e a sua equipa (num brevíssimo apontamento, e que serve de mera ilustração, não basta o candidato Frederico Varandas dizer, em resposta aos seus planos para as modalidades, "continuar a vencer", antes de passar para outras questões, e, para estas últimas, "porque quero vencer", antes de ser vigorosamente aplaudido pela sua própria equipa, em vez de expor um método de trabalho com conhecimento de causa sobre as áreas em questão e os planos concretos que existem para cumprir determinados objectivos dentro delas, tal como não existir disponibilidade para uma apresentação oral completa e transversal do seu projecto, ao contrário do que sucedeu na sessão de esclarecimento com o candidato João Benedito, antes de lhe ser feita qualquer pergunta).  

Por todas estas razões, a candidatura "Raça e Futuro" (duas palavras que nos parecem falar para o que se procura tanto dentro do campo, a nível desportivo, como fora dele, a nível de gestão) é aquela que parece ter mais capacidades para, efectivamente, "unir o Sporting", pacificar o clube pelos seus interesses (e não pelas suas personalidades) e, sobretudo, conseguir governá-lo com uma estratégia de gestão desportiva que se encontra, olhando para as duas equipas, nas mãos de quem efectivamente a experienciou e deseja continuar a trabalhar nela ao longo da sua vida, mostrando uma ideia de desenvolvimento desportivo e estrutural com um conhecimento de causa verdadeiro e realista em todas as áreas do clube. Depositarei, por isso, os meus nove votos na lista A, candidatura de João Benedito, nas eleições do próximo dia 8 de Setembro.